quarta-feira, 19 de março de 2008

A Casa do Bacalhau

R Grilo 54
Lisboa

Na zona oriental da cidade desde há centenas de anos, se construiram mansões solarengas de fidalgos e suas cortes, mais ou menos numerosas, de criadagem, que desde o Paço por esse Tejo arriba foram subindo a montante (daí a palavra Ribatejo, já pensou?...) habitando espaços amplos, quase palácios, alguns de arcadas soberbas, pés direitos invulgares e sentido de espaço acima do comum. Em Chelas, Xabregas e Beato, além dos casos sociais problemáticos, há edificios cheios de história, abandonados, alguns de posse por definir, ao que sabemos; outros há, cuja propriedade já terá caído no Municipio, e que num país de Cultura e cuidado já estariam restaurados, mas que aqui continuam por reabilitar.
A Casa do Bacalhau está nessa zona há cerca de seis anos, onde aproveitou um espaço magnifico, que se diz ter sido das antigas cavalariças do palácio do Duque de Lafões. E tem, talvez, dos tectos mais bonitos da restauração lisboeta. Mas não me revejo nem no resto dos materiais, nem na linguagem estética optada para a sua arquitectura de interiores, com recurso a contraplacados baratos e linhas direitas, que nada conjugam com as arcadas em ogiva, magnificas e monumentais, descarnadas ao tijolo de origem e expostas em toda a sua beleza.
O estacionamento é razoavel, se não houver enchente, devido a um pequeno largo dianteiro. Mesas cobertas com pano e guardanapos também de pano. Cadeiras bonitas e muito confortáveis. Talheres regulares e copos que bem poderiam ser de verdadeiro cristal; veremos adiante porquê. Ausência de marcadores ou centro de mesa.
A ementa propõe sopas, um primeiro prato, um segundo prato e sobremesas. Tem razão, é mesmo preciso.
Na mesa, pão à fatia e azeitonas pisadas, ambos de bom registo. Agora manteiga de pacotinhos é que não...
Foi pedido, para tres comensais, um pratinho de entrada de pastéis de bacalhau (excelentes, vinte valores) e depois um bacalhau verde e uma dose de linguas de coentrada. Ao saber dividido o tal prato verde por duas senhoras presentes, o empregado deu um segundo e terceiro olhar de surda critica latente, que não tem de efectuar. Reprovável.
Vieram os pratos, mas há muito tempo já que teriam sido aquecidos, pois estavam quase frios.
Não nos foi explicado que o bacalhau verde era afinal bacalhau - muito pouco - embrulhado habilmente em couve - muita! - com pimentos vermelhos a enfeitar e tudo salteado em azeite. Agradável e simples confecção, mas com uma quantidade de bacalhau absolutamente ridicula.
As linguas de coentrada estavam divinais, com um molho apurado, no ponto, excelentes e vinham apenas acompanhadas de pequeníssimos triangulos de pão frito. Foi pedido um arroz que estava muito bom, mas chegou demasiado tardio.
A acompanhar, não havendo vinhos da casa, veio uma garrafa de Alabastro branco, vinho leve, aberto e alegre, que se desempenhou bem.
Experimentámos no final farófias de boa consistência e molho agradável.
Numa análise geral, o ambiente é bom, a frequência bem comportada e civilizada, o espaço tem dignidade e gostei do pormenor das pias de pedra com as garrafas no centro. A variedade de pratos de bacalhau - desde os mais prosaicos como o à Braz, ao Zé do Pipo, àquele que provei, por exemplo - parece ser feita com confecção cuidada. Contudo, as porções mínimas obrigam realmente a que se comam entradas, 1º prato, segundo prato e sobremesa, sob pena de se sair muito aquém do minimo exigivel de satisfação. O que, consequentemente, atirará a refeição para alturas financeiras muito imerecidas, a meu ver. Por ausência, neste caso, dos detalhes anteriormente referidos.
As casas de banho são amplas, limpíssimas e o WC tem cabide.
O serviço tem uma nota entre o blasé sem cuidado e a negativa pura. Eu explico. Tudo é relativo ao preço que se paga. Mas aqui as migalhas ficaram por recolher, a atenção dada foi pouca, a simpatia fraca, o atendimento foi quase sempre de passagem, a rogo, e há nitida falta de um chefe de sala com autoridade e olhos para aqueles pequenos pormenores que o cachet da factura exige e justifica. Ah! E lá continua a malfadada mania da factura ter de ser solicitada expressamente, como se fosse um favor.
Conclusão: - Cozinha com pormenores de muito boa nota. Pode ir, se gosta mesmo muito de bacalhau confeccionado de forma criativa e superior, e se dispõe de boa carteira. À cautela, faça-o de forma apoiada em bastantes entradas, sopa, primeiro prato, etc.
...Mas, desculpem lá, arranjo-vos trinta sitios onde poderão comer grandes bacalhaus por um sexto do preço!..

post scriptum- O tecto é que nunca será tão magestoso!

Sala/Mobiliário ****; Porções *; Tempo de espera**; Confecção ****; Serviço **; WC *****; Estacionamento ***; Paisagem/Ambiente ***; Grau de satisfação geral ***
Preço $$$$$

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