Amigos,
As tascas de Portugal são um património inestimável.
Uma enorme referencia de transmissão cultural.
Deviam estar isentas de impostos. Totalmente isentas, ou parcialmente isentas; de acordo galopante com a qualidade, a confecção, a simpatia, o deslumbre de sabores guardados.
Nelas se evocam segredos de um passado comum galaico português, os sabores da pobreza, os petiscos de avós e bisavós, as ervas de leito de ribeira e de sequeiro esquecidas por distraídos e presumidos chefs pseudo-omniscientes, as soluções simples que encheram e deliciaram gerações passadas, enfim, séculos de sapidez e indulgência.
Bem aventuradas as tascas do meu país!
Durante uma vida achei por bem resistir a divulgar estes monumentos de degustação. Para não os ver invadidos por selváticos usufruidores banais, e para que nunca tivessem o sucesso que os poderá estragar, aviltar, vulgarizar e enlouquecer aos olhos da clientela íntima e conhecedora. Crueldade pura.
Hoje aqui, neste espaço de elegância e intimidade reservado a maiores de gosto e luxúria, vos prometo abordar - devagar, para que se cumpra um ritual de passagem solene mas discreto e progressivo...- a gastronomia de algumas merecedoras tascas ocultas e secretas de Portugal.
Sempre me ensinaram, de pequeno, que a suprema aristocracia dos gostos não invalida nem exclui, a priori, nenhum sitio, nenhum sabor, nenhum aroma, nenhum local, nenhum produto, nenhuma opinião, até prova factual em seu desabono.;
Com efeito, desde que cumpridas as normas de higiene - não, desde logo, as que a ASAE estupidamente impõe , mas as que o senso comum e equilíbrio mental exigem...- uma boa confecção é sempre uma boa confecção; e um prato desastroso e mal equilibrado será sempre um desgosto ao consumidor, por muito disfarçado que esteja de criatividade estética e presunção artística, mesmo que nos seja apresentado no mais majestoso e dispendioso restaurante.
Há, com efeito, uma perversa relação habitual de causa e efeito que urge combater no que concerne ao acto de frequentar espaços de grande marcação e visibilidade. Nunca se comeu bem numa sala, só pela majestade dos seus lustres, ou o velho e respeitável dourado de sua talha.
O mesmo é válido, infelizmente, para um tipo de snack que poderia e deveria ter mantido o registo de tasca, sem aspirar a modernices nem a servir cem almoços, só para melhor facturar combatendo a crise. A crise combate-se com a qualidade e o assomo de coragem de continuar a defender a gastronomia de origem demarcada.
Neste espaço tanto se relatarão visitas e críticas a Restaurantes de referência nacional, como das ocultas e sempre esquecidas tascas onde - num outro enquadramento e clave alimentar...- se consomem bens e sabores que sejam igualmente de referenciar.
Não ressalte, contudo, deste post a falsa impressão de um desconfiado trato preconceituoso e imbecil contra a restauração de alta cozinha, que é obviamente, uma das artes maiores da existência, comparável ao saber de um Velásquez, um Malhoa, um Mozart ou um Verdi.
Mas quis salientar e relevar a intenção de aqui desejar efectuar uma abordagem ecléctica da apreciação alimentar, pois me parece que esse é sempre um lado omisso na crítica gastronómica que se faz neste país. E os espaços merecem todos a mesma atenção, ou quase.
Uns a um nível absoluto de arte e prazer conceptual; e outros ao nível da sua utilidade social e histórica na conservação de valores tradicionais.
Frequentem este blog e embarquem comigo, se possível, - ao mesmo tempo que, comentando e informando, me auxiliem... - neste tão ingrato trabalho de avaliar e descobrir o incomensurável e sempre surpreendente gosto de viver.
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