domingo, 1 de junho de 2008

Restaurante Sº António



Beco de S. Miguel, nº 7
Lisboa

A velha e saborosa Alfama nunca deixou de ser um emblema único na Lisboa antiga. Um espaço histórico de enorme beleza. As suas ruas, vielas e becos são um traço eterno de uma certa e típica kashbah alfacinha. Nos santos populares a coisa refina, enchendo-se de luz e de cor. Mas basta ver este velho povo simples, que ainda estende a sua roupa na janela ou na porta, e chama o vizinho do lado se precisar de ajuda, e vem para rua cantar o fado em esplanadas improvisadas para sentir que este bairro será eternamente uma alma maior de Lisboa. Respira-se um cheiro marítimo e navegante, como se os navios não parassem de aportar e zarpar e o petisco pairasse no ar, em tasquinhas de vinho a copo, fado vadio e fama perdida.
Há contudo, hoje, uma outra Alfama, nobre e tipica, aproveitada dos imóveis restaurados que começam a surgir aqui e ali, por sua vez fruto de uma renovada visão empresarial, tanto no investimento imobiliário, como numa nova restauração de qualidade.
Nesse quadro, terá sido o que pensaram duas figuras conhecidas da Tv, ambos actores, avançando para um Restaurante de bom nivel no Beco de S. Miguel. Nada menos que um prédio completo, de três pisos, com uma sala por piso e ainda esplanada na entrada, à sombra de uma latada exuberante .
O acolhimento é simpático, feito por pessoal jovem e esforçado, que nos põe uma toalha de papel reciclado na mesa e um aperitivo de casca de batata nova frita com maionese, preparo que está a revelar-se habitual e é, sem dúvida, um achado recente, mas de efeito certo. As azeitonas preparadas e azeitadas com ervas estavam bem e, ao que parece, ajudam a manter os comensais entretidos durante a longa espera. Mas ali não se deve ir com pressas, o local merece disfrute e a culinária também.
Foram pedidas três entradas - salada de endívias, morcela com doce de maçã e pedaços de brie frito com compota. Todas cumpriram, com destaque para a morcela e o brie, que estiveram muito bem. De lamentar que não viessem todas ao mesmo tempo, denotando um desfasamento de serviço. A acompanhar optámos por um tinto de Pias que evoluiu muito quando foi solicitado o jarro de decantação que não viera ab initio.
Na sequência foram encomendados três pratos - Coxa de pato no forno, Bife com molho de mostarda e Magret de pato. Todos os pratos demoraram uma eternidade a chegar mas, sendo noite de sexta feira, ninguém esteve para se incomodar muito com isso. O projecto de noite pode ser precisamente ficar por ali. O ambiente é entre o jovem e o "intelectual/branché", sempre seleccionado; além dos turistas normais, trazidos por indicação casual ou eventual referência em roteiros.
As salas, com efeito, são bem decoradas, com base num espantoso espólio de centenas de fotos de gente ligada as artes, em especial ao cinema. Como se diz em neo calão pós-moderno - está-se bem, apesar dos bancos sem costas em algumas mesas. O sitio é in, fashion e contudo, ao contrário doutros que também estão na moda, por vezes injustificadamente, o espaço é de facto agradável e muito simpático.
O bife esteve tenro, com molho equilibrado, como pertence. As coxas eram imensas e bem apaladadas, embora um pouco rijas. O magret estava muito bom, e embora o chef tivesse optado por um ponto relativamente passado, de optima confecção.
Deram-nos dois molhos possiveis para acompanhamento, um com uma base em sumo de laranja e o outro com o que me pareceu uma redução de molho de soja, caldo do proprio palmípede e talvez Porto. O acompanhamento pouco variou em ambos - couve flor, bróculos, batata estufada na prata com maionese, três pedaços de feijão verde, três pedaços de cenoura e uma fatia de gourgette. Equilibrado.
À sobremesa foi provado um cheese cake que estava bem confeccionado.
Estacionamento impossivel e, já agora, aviso à navegação - é preciso subir um bom pedaço pois trata-se de zona pedonal absoluta, sem passagem de carros.
Na noite lisboeta, é uma surpresa de boa imagem e razoável compromisso qualidade/preço, embora não deva esperar favores na conta final, sobretudo se entrar em vinhos velhos,claro. Aí, passa a caro num instante.
Agora, uma observação muito minha. Eu, pessoalmente, fico chocado ao ver - num local tão vernáculo, tão típico e tão português - um menu carregado de pastas, fetuccinis, carpaccios, magrets e outras especialidades estrangeiras. Os proprietários lá saberão. Mas choca-me. Paciência. Tinha de dizer.
À parte isso, vejo os únicos contras na excessiva lentidão no serviço do chef (equatoriano, imagine-se!...) talvez por ser sexta-feira, mas, sobretudo, coisa que não perdoo, nota negativa demais para dois vasos monumentais em plástico translúcido e iluminado, postos à porta por mão alucinada, kitsh ou simplesmente maldosa. Tirem aquilo dali, urgentemente, em nome do bom gosto que impera pela casa dentro, por favor!
Noite muito agradável, se não olharmos para tais estranhíssimas, abstrusas e despropositadas iluminárias...
Ideal para levar a namorada (ou o namorado...) comer bem e fazer boa figura.

Resumo

Sala/Mobiliário ****; Porções***; Tempo de espera*; Confecção ****; Serviço ***; WC *** Estacionamento - o; Paisagem/Ambiente ****; Grau de satisfação geral ****
Preço $$$

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